Acadêmicos do Cubango

FICHA TÉCNICA

Presidente: Rogério Belisário
Carnavalesco: Gabriel Haddad e Leonardo Bora
Diretor de Carnaval: Márcio André
Diretor de Harmonia: Allan Guimarães e Daniel Katar
Intérprete: Thiago Brito
1º Casal de Mestre-Sala e Porta-Bandeira: Diego Falcão e Patrícia Cunha
Mestre de Bateria: Demétrius
Rainha de Bateria: Maryanne Hipólito
Comissão de Frente: Sérgio Lobato
Classificação em 2018: 5º Lugar
Classificação em 2017: 8.º Lugar
Classificação em 2016: 6.º Lugar
Títulos: Especial: 0
Série A: 0
Série B: 2 (2002, 2009)
Enredo 2019: Igbá Cubango – a alma das coisas e a arte dos milagres

 

SINOPSE:

Objetos de poder, objetos de devoção, objetos-dádivas, objetos que possuem alma e contam histórias, objetos de pedir e pagar, objetos que traduzem graças, objetos encantados, objetos-amuletos, objetos-relíquias, objetos que operam milagres – e que mentem milagres também. O G.R.E.S. Acadêmicos do Cubango pede a proteção de Babalotim, o “ídolo menino” que completa 40 anos, e agradece a São Lázaro, o padroeiro, pelo sonho vivido no último cortejo. Romeiro, cada sambista carrega consigo as suas obrigações. O que pretendemos contar são causos da religiosidade popular brasileira a partir da relação de cada sujeito com os seus objetos de culto. Somos devotos dos tambores ancestrais: rum, rumpi e lé. O desfile é o nosso ex-voto, o samba é a nossa graça. Porém é preciso cuidado com as promessas dos falsos profetas – novíssimos Reis da Vela com as suas coroas de lata, votos que perpetuam o medo e o preconceito.

​Sambemos!

Carrego de Exu eu não quero carregar. Mas amuleto, o que é que há?

​- Ko si ọba kan, ofi, Ọlọrun.

SINOPSE DO ENREDO

1 – Igbá Cubango

Na festa de Domurixá
em homenagem a Oxum
Deusa da nação Ijexá
onde a figura principal
era o boneco Babalotim
mensageiro da alegria, da força do axé
um ídolo menino, levado por menino em sua fé
e assim teve origem o Afoxé
Heraldo Faria e João Belém – Afoxé

​Igbá Cubango! Guardamos nessas cabaças as memórias antepassadas. Fundamentos. Levamos para a Avenida o peji das nossas vitórias: evocamos o dom de Afoxé, o samba que se fez milagre. Assentamos, aqui, nossa história. Da palha fazemos um trono. O ídolo-menino de outrora é revivido na Passarela: que todo componente da escola a ele dirija um pedido. Valei-nos, Babalotim! Oxum traz os seus axés: pedras do fundo do rio, pentes de tartaruga. Otás. São Lázaro se transforma: Obaluaê, Omolu, Xapanã, na porta da nossa quadra, no Morro do Abacaxi. Saúda e protege os sambistas, que a ele oferecem presentes. Giram laguidibás, giram saias, giram guias. Chifres de búfalos, asas de besouros. Mães-baianas, turbantes e panos da costa, cobrem o chão de pipocas. As mãos nos atabaques, os pés na terra. Os corpos-terreiros fervem e alguém, enfim, anuncia: agarrem as suas figas para mais uma sagração!

2 – De pedir proteção

Laguidibá
não é simples ornamento
é colar de fundamento
você tem que respeitar
(…)
Laguidibá
é adereço muito certo
é coisa de santo velho
do Antigo Daomé
Nei Lopes – Laguidibá

​Fizemos Cristo nascer na Bahia. Ou em Belém do Pará. O barroco tropical brasileiro reuniu em um mesmo oratório as relíquias dos santos de lá às penas caboclas de cá. Nos balangandãs de prata, romãs e muiraquitãs. Medalhas. Uma figa, uma rosácea, um coração, um crucifixo. Búzios, firmas, fitas, fios de conta. Dentes de animais encastoados. Pulseiras, colares, cocares. Calungas. Me banhei com guiné, alfazema e dandá. Defumei com quarô, benjoim. Patuás. Ourivesaria sagrada, jóias de mandingueiras. Quase tudo se faz amuleto, pedir proteção é de praxe – “basta encontrar na rua um fetiche qualquer, pedra, pedaço de ferro ou concha do mar”, escreveu João do Rio, nas quebradas. O seguro morreu de velho e é preciso se precaver: fechar o corpo, tomar a sorte, ganhar coragem, fazer os nós. Nos sacrários das sacristias, nos segredos dos Candomblés. Ebós. Arriar comidas nos entroncamentos. Carrancas pra navegar, máscaras nos bailados. Terços e escapulários – e um pouquinho de pó de pemba.

3 – De pagar promessas

No alto do morro chega a procissão.
Um leproso de opa empunha o estandarte.
As coxas das romeiras brincam no vento.
Os homens cantam, cantam sem parar.
(…)
No adro da igreja há pinga, café,
imagens, fenômenos, baralhos, cigarros
e um sol imenso que lambuza de ouro
o pó das feridas e o pó das muletas.
Carlos Drummond de Andrade – Romaria

Pedido feito, graça recebida – então é preciso pagar. Caminhar, seguir romaria. Carregar uma cruz tão pesada, o drama de Zé-do-Burro. Nas mãos calejadas da lida, cem mil corações em brasa. Ex-votos do Brasil inteiro desenham um mapa de pernas. O catolicismo popular expressa as andanças da nossa gente: Bonfim, Nazaré, Matosinhos, Bom Jesus, Pai Eterno, Canindé, Monte Santo, Juazeiro, e lá se vai a multidão cantando. Que ex-voto levo à Aparecida, se não tenho doença e só lhe peço a cura? – questionou Adélia Prado. São Judas Tadeu – Niterói. A Candelária, a Penha, a Penna. Nos “museus das promessas ou dos milagres”, como o descrito por Jorge Amado, vê-se a sobreposição de dádivas: barro, cera, madeira, papel. São partes do corpo, são pinturas, são retratos e miniaturas (de casas, de bichos, de barcos, de gratidão). Cartas, bilhetes, roupas, diplomas. Vitalino esculpiu ex-votos, Mestre Fida é uma referência. Artistas contemporâneos revisitam o imaginário – mesmo o Bispo do Rosário, que tanta alegria nos deu, a quem novamente rogamos: olhai por nós, nobre peregrino! Cada rosto esculpido foi dor alentada. (…) Deixa a dor nas aras, como ex-voto aos deuses – e segue o teu destino!

4 – Da (falsa) promessa que é dívida

HELOÍSA – Ficaste o Rei da Vela!
ABELARDO I – Com muita honra! O Rei da Vela miserável
dos agonizantes. O Rei da Vela de sebo. E da vela feudal que nos fez
adormecer em criança pensando nas histórias das negras velhas…
Da vela pequeno-burguesa dos oratórios e das escritas em casa… (…)
Num país medieval como o nosso, quem se atreve a passar
os umbrais da eternidade sem uma vela na mão?
Herdo um tostão de cada morto nacional!
Oswald de Andrade – O Rei da Vela

​Mas há os falsos profetas e as falsas promessas à venda. Objetos de todo tipo, no shopping-cassino da unção. É água de benzer camisa, é caneta de assinar contrato, é tijolo para erguer a casa, é vassoura de varrer o diabo. Travesseiros para sonhos bons, redes de pescar vitórias. E velas aos borbotões! Não é outro que não a vela o mais famoso objeto votivo: de pedir, pagar, prometer. Abelardo I, o Rei da Vela, lucrou e fez fortuna explorando a miséria alheia. A crítica de Oswald de Andrade, Antropofagia e Tropicália, permanece ferida aberta no peito do Brasil atual. São promessas que viram cifras e moedas que se avolumam: qual é o preço a se pagar por um lugar confortável no céu? E que céu tão nublado é este, que mais exclui do que celebra a diferença? Dívidas que se pagam a preços exorbitantes – inclusive um outro tipo de voto, nem devoto nem ex-voto: o voto depositado nas urnas eleitorais.

​Que as velas acendam pedidos de dias mais iluminados. Afinal, já dizia o poeta: há sempre uma promessa de alegria…

Amém, Axé, Evoé, Saravá!

– Glória pro fio de Exu!

SAMBA-ENREDO
Compositores: Robson Ramos, Sardinha, Duda Tonon, Anderson Lemos, Ailtinho, Sérgio Careca, Carlão do Caranguejo e Samir Trindade

Menino babaloim no sagrado afoxé
Aos pés do morro fiz o meu terreiro
Onde o padroeiro me protege em seu altar
Atotô eu bao cabeça pra Omulu
Nesse chão em pipoca pro santo
Oferendas do meu mundo verde e branco

Ê saruê baiana, Ê saruê baiana
Gira laguidibá, giram saias e guias
Carrega meu patuá em sabedoria

Búzios, carrancas e balangandãs
Relíquias iluminam meu caminho
Ao meu “padim”, eu amarro a minha fé
A cruz no peito pra abençoar
Já fiz promessa, o migagre vai chegar
Em romaria eu agradeci
Desacreditado, acreditei
A cura da alma, o terço na mão
Um coração bordado ao divino rei
Senhor, tem piedade de nós
Eis a oração em nossa voz
Tem gente vendendo ao povo ilusão
Acendo vela, peço salvação

Ko si oba kan, ôôôô
Ofi Olorum ôôôô
Igba Cubango, meu amuleto
Proteção e amor

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