Foto: Pablo Sander

Com amor, Zé Katimba

Homenageado da 13ª edição do Prêmio Plumas e Paetês levou todos às lágrimas

Na pequena Guarabira, no brejo da Paraíba, nasceu José Inácio dos Santos, mais conhecido como Zé Katimba. E no último sábado, dia de 01 de julho de 2017, no Teatro Carlos Gomes, nasceu minha mais profunda admiração por esse homem – que eu já respeitava pela obra. Ainda não tinha tido a oportunidade de estar junto – e ainda receber um abraço, como o que recebi desse senhor depois de sua apresentação. Era também a minha primeira vez frente a frente com um homenageado do Prêmio Plumas & Paetês, um evento tão importante para história e cultura do carnaval. Era como esse eu fosse o premiado! Ali, naquele momento, era como se eu mesmo estivesse recebendo aquela homenagem em vida, justamente por amar tanto essa festa que é o carnaval. Tenho certeza que a maioria dos presentes sentiu a mesma coisa.

Preciso falar que, antes de receber aquele abraço, acompanhei a apresentação do Zé Katimba no palco, por onde já passaram grandes artistas e grandes espetáculos. Que apresentação maravilhosa e emocionante! Grande para um Zé que parece tão pequeno e até frágil. Só parece. Cantou e contou sobre as belíssimas e memoráveis canções de sua própria autoria ou com parceiros ilustres. Ele, que nos brindou inicialmente com a canção “Mãe Paraíba”, dele e de Toninho Professor. Depois com “Sorriso da mulata”, feita em parceria com Adilson Madrugada, seguida de “Ê mana e Bandeira da fé”, ambas em parceria com o mestre Martinho da Vila. Antes de cantar “Tá delícia, tá gostoso” – canção dele e Alceu Maia –, Zé Katimba falou sobre receber uma homenagem como essa do Prêmio Plumas & Paetês aos 84 anos de vida. Falou sobre a dificuldade de fazer um evento como esse, com pouco apoio e dinheiro, e que isso não é fácil. Falou sobre como não podemos desistir, mesmo quando vivemos momentos tenebrosos como os atuais, não só no samba e no Carnaval, como também na própria cidade do Rio e no Brasil. Citou por muitas vezes, aliás, uma frase durante toda a festa:

“Vai ter jeito!”

Antes de começar a canção Na minha veia, essa também em parceria com Martinho da Vila, lembrou de Neli. “Conheci Neli quando estava esperando a morte chegar. A vida não tinha graça nenhuma, era depressão, eu não gosto de depressão, detesto.” Como foi tocante a forma como ele disse isso. Disse também: “Tomara que vocês tenham uma amiga como eu tenho, pra vida inteira, essa canção é pra Neli”.

“Você é uma lua cheia
Que lá no meu céu descamba
Porém não é só minha musa
Na minha cabeça confusa
Você é o meu próprio samba”

Nem preciso dizer que ali eu já estava tomado de emoção. Emoção essa que preparava o espaço para, em seguida, embaçar meus olhos de vez. Aí entramos em um dos momentos mais tocantes da noite. Ele ia cantar a música Viola de fita, de sua autoria. Antes, disse: “emoção demais (referindo-se ao momento no palco). E eu não morri. Já tive câncer três vezes, não morri de câncer, eu vou morrer de alegria? Não sou burro. Sou feio, mas não sou burro”. Era assim, um misto de alegria e emoção que estava embargada em sua voz.

“Essa herança musical minha, é uma herança musical que veio do meu pai”, disse Zé. O pai fazia literatura de cordel e tocava viola. Participava de desafios de viola e ganhava uma fita toda vez que vencia um desafio – por isso o nome “Viola de fita”. Aos risos, Zé Katimba disse que, na época, achava cafona e feia a viola do pai. Mas lembrou-se em seguida: cafona é quem fala isso. “Eu fiz essa canção para meu pai, porque odiei meu pai por um tempo. Ele não podia beber, pois ficava alterado. Ele bateu em minha mãe. Eu tinha 5 a 6 anos. Na época não entendia. Ele é a pessoa que mais amei na minha vida, depois do perdão. Perdoei e amei muito o meu pai. É difícil perdoar. Eu perdoei meu pai! Ele era maravilhoso e depois que fui ver!”

A sensibilidade desse artista é algo invejável! E falou nesse momento sobre a Cultura Popular, que estava sendo biografado pela segunda vez. Falou da junção entre a Cultura Popular e a Academia. Recordo que nunca teve a oportunidade de sentar ao lado de um professor e que foi uma menina na fazenda quem o ensinou a escrever seu nome, fazendo muito esforço. “Eu amo cultura. Aprendi a juntar as letrinhas feito o Zeca Diabo (personagem do Lima Duarte, na novela “O Bem Amado”) e hoje tenho minha obra espalhada pelo mundo! Força literária e nunca mais parei de ler. Hoje menos, porque não tenho enxergado muito bem”, disse ele, brincando com o público presente.

Em seguida disse em tom baixinho, como se dissesse para si mesmo: “Se você perder tudo como a viola do meu pai, que ficou abandonada, você perde, é difícil. Zé Katimba fez uma pausa para tentar cantar. Iniciou a canção. Segundos depois, caiu em prantos. E assim, em prantos ficamos todos com aquele momento. Recuperado, foi a vez de cantar Minha e tua, uma bela canção em parceria com Martinho da Vila e Alceu Maia. “Tomara que vocês, cada um de vocês, sintam várias vezes, muitas vezes, por muitos anos, uma emoção assim como estou sentindo”, disse o compositor. Lembrou de nomes importantes para ele, como de Adelson Alves, Dona Ivone Lara, do grande amigo Monarco, que nunca o abandonou. “Vida longa pra vocês”, falou.

E eu digo: vida longa e eterna para ti, Zé Katimba!

Teatro Carlos Gomes – Foto: Pablo Sander

Logicamente, Zé não poderia terminar sua apresentação sem homenagear sua Escola de Samba querida, a Imperatriz Leopoldinense. A “Rainha de Ramos”, como ele a chamou. Escola que ajudou a fundar e, como compositor de mão cheia que é, colocou obras inesquecíveis e campeãs na Avenida, como Martim Cererê (Carnaval de 1972), com o parceiro Gibi, e o samba que deu o campeonato à agremiação de Ramos em 1981 Só da Lalá, também em parceria com Gibi, e Serjão.

“Alô Ramos, alô Imperatriz! Cada um de vocês moram no meu coração. Obrigado aos fundadores e a todos do subúrbio de Ramos. Obrigado ao povo da Imperatriz. Todas as Escolas, da menor a maior Escola. Todos os sambistas estão guardados no meu coração. Aliás, no meu coração não. Sabe o que eu descobri? Descobri a gente não está com o “amor no coração”. Quando o cara arranca (Se referindo a quem faz transplante do coração) e bota outro, ele continua amando a mulher, os filhos. O coração foi embora, mas ele lembra. Foi trocado, Mas o sentimento fica. Então, vou guardar vocês onde devem ser guardados: na minha mente!”.

Isso é coisa que só um poeta de verdade poderia dizer.

Assim ele finaliza, agradecendo ao José Antônio, criador e diretor executivo do Prêmio Plumas & Paetês, e a todos os presentes.

QUE MOMENTO LINDO E EMOCIONANTE!

E Zé Katimba encerra sua apresentação com Novo conceito, canção em parceria com Eri Galvão.

Vida longa ao Prêmio Plumas & Paetês! Obrigado, Zé Katimba, por dividir conosco sua emoção! E obrigado, José Antônio, por permitir que os Carnavalizados pudessem contribuir e fazer parte desse momento tão especial para vida desse artista e também para os profissionais do Mundo do Samba.

Axé!

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